1 de Junho de 2020 - Campinas - SP
A modalidade de pós-graduação Lato Sensu é caracterizada pelo MEC ⁽¹⁾ como programas de especialização com duração mínima de 360 horas e que ao fim concedem um certificado, e não diploma, ao concluinte. Tal modalidade é oferecida no formato de cursos de especialização pela Escola de Extensão da UNICAMP (EXTECAMP), que atualmente já é autorizada a cobrar cursos de extensão. Entretanto, alguns destes cursos Lato Sensu oferecidos não atendem este requisito mínimo de carga horária, fazendo com que estes não sejam reconhecidos por alguns Conselhos ⁽²⁾. No segundo semestre de 2019, a Câmara de Ensino, Pesquisa e Extensão (CEPE) discutiu, e aprovou, a proposta de alteração do Regimento de Pós-Graduação da UNICAMP, em que seria flexibilizado a questão da gratuidade dos cursos de Lato Sensu oferecidos pela Universidade ⁽²⁾. No dia 02/06/2020, esta mesma proposta será votada no órgão máximo deliberativo da UNICAMP: o Conselho Universitário (CONSU). Vale ressaltar esta tática comumente praticada pelos órgãos deliberativos da UNICAMP, em que decisões extremamente importantes como esta são pautadas sem nenhum debate prévio e amplo com a totalidade da comunidade acadêmica, além de que são agendadas para períodos em que não é possível a mobilização combativa dos estudantes para reivindicá-las. O mesmo aconteceu, por exemplo, com a votação do aumento do preço do RU, que se deu no período de férias em dezembro de 2017.
Historicamente, com especial avanço nas últimas duas décadas, o ataque à gratuidade tem pairado sobre as universidades públicas. O Governo obscurantista de Bolsonaro não mede esforços para garantir o desmonte do sistema público de ensino, já precarizado: junto dos ministros Weintraub e Guedes, defende a cobrança de mensalidades na universidades públicas, além de implementarem cortes e contingenciamentos orçamentários e desenvolverem programas, como Future-se, que atacam não só a gratuidade, mas também a autonomia universitária. O corte orçamentário de 72 milhões de reais realizado pela reitoria da UNICAMP em resposta ao agravamento da crise econômica, também denunciado pelo CAEQ (https://bit.ly/2yKTtVg), escancara esse descaso e incentivo à precarização do ensino público e de qualidade, pautado também pelos Governos Estaduais, não apenas Federais. Em um cenário de pandemia de COVID-19, que explicita a importância da ciência e do ensino universitário, atitudes como estas refletem ainda mais claramente uma ânsia privatista de ensino, objetivando e promovendo a sua mercantilização, já que incentivam a Universidade a buscar cada vez mais recursos privados. O pagamento do cursos Lato Sensu, portanto, pode ser encarado como um primeiro passo no caminho da almejada privatização ampla do Ensino Superior no Brasil. Importante ressaltar também a influência do capital financeiro no planejamento e oferecimento desses cursos de especialização, atuando como mais um braço do tecnicismo. A pós-graduação Stricto Sensu, que prevê o desenvolvimento de dissertação ou tese, tem sido a grande responsável pelo desenvolvimento científico e tecnológico do país, a salários baixíssimos que não são reajustados desde o começo da década passada. Entretanto, vemos que a pós-graduação, junto à ciência brasileira, tem se afastado cada vez mais do caráter de universalização. A ciência e tecnologia produzidas na Universidade muitas vezes não são acessíveis à população: além de não atenderem às reais demandas urgentes da sociedade, ainda carecem de políticas de acesso que garantam à população entrada nesses espaços. Esse distanciamento faz com que as instituições de ensino superior percam a credibilidade junto à população, incentivando discursos políticos a favor da precarização do ensino público e até mesmo do fechamento de campi. Assim, é extremamente necessário e urgente romper os muros da Universidade, trazendo as demandas do povo para o cerne do desenvolvimento científico e devolvendo a produção de forma efetiva e prática para a sociedade como um todo.
Sendo assim, debates como este, de pagamento dos cursos de Lato Sensu, demonstram como a Unicamp tem se dobrado à alternativa mais popular junto ao governo: a de buscar financiamento privado, desdobrando-se a atender interesses mercadológicos e afastando-se ainda mais da população a que serve ⁽³⁾. É indiscutível que a Unicamp vem sofrido problemas financeiros nos últimos anos. Entretanto, a defesa dessa pauta por parte da reitoria escancara a falsa necessidade de busca de recursos próprios por parte da Universidade (como é muito desejado pelo programa Future-se também) e isenta o governo da sua responsabilidade e compromisso para com o financiamento público das Universidades. Sabemos que em breve a reforma tributária ameaçará o orçamento das Universidades estaduais paulistas, e mesmo assim a reitoria da Unicamp se recusa a pressionar o governo do Estado nesse sentido. Logo, ataca diretamente os aspectos fundamentais da Universidade e que devem ser defendidos a todo custo: público, gratuito e autônomo. Além disso, a reitoria escora-se na premissa de que a Universidade deve buscar parcerias privadas para se sustentar, sendo que a maior parte das empresas estabelecidas no Brasil têm pouco interesse em investir em pesquisa nas Universidades ou de procurar seus serviços, de forma geral.
Com isso, reiteramos nosso posicionamento contrário à cobrança dos cursos de Lato Sensu e desprezamos essa postura entreguista e autoritária da reitoria. Defendemos a educação pública, gratuita, científica e de qualidade em todos os níveis de ensino, bem como o desenvolvimento da pesquisa e da ciência brasileira livre das amarras dos interesses do capital financeiro, principalmente estrangeiro. Não aceitaremos que a pós-graduação vire mais um nicho de mercado a fim de cumprir a agenda neoliberal do Estado.
Gestão Maré 2020
Referências:
1. Qual a diferença entre pós-graduação lato sensu e stricto sensu? Portal do Ministério da Educação. Disponível em: <https://bit.ly/3eyf3vt>. Acesso em 30/05/2020. 2. Relatório do GT Estudantil Lato Sensu. APG UNICAMP. Disponível em: <https://bit.ly/2BidDHe>. Acesso em 30/05/2020.
3. TORRES, L. A Mercantilização da Pós-Graduação Lato Sensu no Brasil. 23. ed. Curitiba - PR: APPRIS, 2018. 280p .
ASSINAM ESSA NOTA:
CAPMF - Centro Acadêmico de Pedagogia Marielle Franco CAFEQ - Centro Acadêmico Robert Perry (Engenharia Química) CAGEAC - Centro Acadêmico de Geologia Asit Choudhuri CAAL - Centro Acadêmico Adolf Lutz (Medicina)
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